Quem são os responsáveis e quais as consequências do desmatamento no Cerrado?
Estudo recente do MapBiomas mostra que a agropecuária, especialmente a abertura de pastos e o plantio de soja, são responsáveis por 99% do desmatamento no Cerrado. Vale ressaltar que a atividade responsável pela parcela mais significativa do desmatamento (histórico e atual) no bioma é o agronegócio, e não a agricultura familiar.
E, apesar do governo tanto incentivar a produção de commodities, sob a lógica do “progresso econômico”, essas atividades não são convertidas em crescimento econômico e social para a população local. Isso ocorre, dentre outros motivos, devido a Lei Kandir (87/1996), que estabelece que os produtos de exportação não manufaturados são isentos da cobrança do ICMS, fazendo com que os municípios arrecadem muito pouco com a exportação de produtos como soja, milho, carne, etc. Além disso, o agronegócio possui baixa capacidade de criação de empregos devido a alta tecnificação das práticas agrícolas.
Tendo em vista que as áreas de Cerrado com maior aptidão agrícola já foram desmatadas nos últimos 40 anos, seria esperado que o desmatamento diminuísse expressivamente a cada ano, o que não tem sido observado. Além dos óbvios impactos sobre os serviços ecossistêmicos do Cerrado, incluindo provimento de água, proteção da biodiversidade e regulação do clima, dos quais a própria agropecuária depende, temos outro problema associado ao desmatamento, a nossa reputação frente ao mercado internacional. O mundo está fechando as portas para a compra de produtos provenientes de novas áreas desmatadas. Como exemplo, podemos citar a recente manifestação de parlamentares dos EUA e da europa, solicitando a investigação das práticas de desmatamento associadas a produção pecuária de uma grande multinacional brasileira.
Além disso, não há necessidade de desmatar novas áreas, pois apenas no Cerrado, existem cerca de 35 Milhões de hectares de pastagens degradadas (uma área do tamanho da Alemanha) com baixa capacidade produtiva, que podem ser restauradas e melhor aproveitadas.
O setor agrícola deve se tornar um aliado na luta pelo combate ao desmatamento, já que boa parte do Cerrado que ainda temos está em terras privadas, e deve ser preservado na forma de Reservas Legais e Áreas de Preseservação Permanente, conforme exigências do Código Florestal, e até na forma de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), conforme o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Está muito claro que a capacidade produtiva e a comercialização dos produtos agrícolas dependem disso.
A estratégia para reduzir o desmatamento no Cerrado já é bem conhecida, e consiste em ocuparmos o território de forma planejada e estratégica, aproveitando áreas já abertas, restaurando áreas degradadas, conservando a vegetação nativa, criando novas unidades de conservação e aprimorando a gestão das que já existem, dando visibilidade e garantindo o direito à terra aos povos e comunidades tradicionais, fortalecendo cadeias produtivas do extrativismo e da agricultura familiar e, por fim, garantindo o monitoramento do desmatamento no bioma.
Nota Técnica por Giovanna Cordeiro
Analista em Conservação da Biodiversidade do Instituto Cerrados