O Instituto Cerrados (IC) é uma Organização da Sociedade Civil, sediada em Brasília, que há 12 anos atua na proteção do bioma Cerrado. Nossa missão é combater o desmatamento por meio do fortalecimento de alternativas sustentáveis, em especial as reservas particulares e o agroextrativismo. Temos como meta a proteção de 1 milhão de hectares do bioma até 2050, e para tanto, atuamos por meio de diferentes estratégias, organizadas em programas:
O Cerrado possui um papel fundamental muito além de suas fronteiras. É a savana mais biodiversa do mundo, possui importante papel regulador do clima regional e é um bioma crítico para a gestão sustentável dos recursos hídricos do continente. A “caixa d’água do Brasil” abriga as cabeceiras de importantes bacias hidrográficas do país, e por fazer fronteira com quase todos outros biomas brasileiros, tem papel fundamental na manutenção e conservação dos recursos hídricos de distintos biomas do continente (Salmona et al., 2023).
Apesar disso, estima-se que quase metade da sua cobertura original já foi desmatada, principalmente para fins agropecuários. A rápida expansão da agropecuária e outras atividades humanas já levaram a uma significativa redução e fragmentação dos habitats, com profundas implicações para a biodiversidade, o clima e os recursos hídricos. Diferentes pressões explicam a extrema vulnerabilidade do Cerrado hoje. Uma das mais significantes é a falta de esforços de conservação e de políticas de proteção na mesma proporção que outros biomas.
A título de exemplo, apenas 8,21% do território do Cerrado se encontra sob alguma forma oficial de proteção integral ou de desenvolvimento sustentável (ICMBIO, 2022), e exige-se apenas 20% de designação de proteção em áreas privadas à título de Reserva Legal - comparado a 80% na Amazônia. Ademais, o monitoramento e aplicação da legislação ambiental, tanto em áreas oficiais de proteção e conservação, como em áreas privadas é um problema crônico do bioma.
A falta de prioridade política para uma conservação mais efetiva do Cerrado se apóia nos diferentes níveis de exigência internacional do cumprimento de medidas efetivas de uso sustentável do Cerrado. Enquanto se observa uma forte pressão internacional para a proteção efetiva da Amazônia - seja através de acordos internacionais relativos a meio ambiente, seja por meio de exigências de mercado -, pouco se vislumbra com relação à proteção do Cerrado. A exemplo, recente discussão no âmbito da União Européia para avanço de uma legislação que impeça importação de produtos oriundos do desmatamento tende a autorizar a compra de commodities agrícolas de ecossistemas savânicos (woodlands) e campestres (grasslands) do Cerrado, enquanto busca regular de forma rígida aqueles provenientes da Amazônia (DW, 2022).
É no território do MATOPIBA, última “fronteira do Cerrado”, que hoje se observa rápida expansão da agropecuária para a produção de commodities, com fortes impactos sociais, ambientais e econômicos. A expansão da agro-indústria de commodities na região, sobretudo a expansão do complexo soja, tem sido associada a um forte desmatamento, degradação de solos, conflitos agrários e por recursos hídricos, e um desenvolvimento econômico extremamente desigual (Favareto, 2019). Como grande parte da produção de soja é exportada de forma direta ou indireta (i.e, quando incorporada na produção de proteína animal), existe interesse em entender de que forma medidas de comércio internacional, como certificações socioambientais, políticas de importação de desmatamento, moratórias, dentre outras, podem influenciar a trajetória do crescimento deste complexo.
Além do papel do comércio internacional, entendemos que os biomas são biologicamente, economicamente e socialmente interdependentes e não devem ser priorizados, um em detrimento do outro. E que uma estratégia para alcançar maior priorização social e política do Cerrado possa estar na articulação com movimentos sócio-ambientais que lutam pela conservação de outros biomas savânicos ao redor do mundo.
As coalizões de proteção de florestas tropicais são relativamente bem sucedidas em aumentar a relevância política da proteção destes biomas, através de medidas de conscientização global, ações de comunicação, pesquisa, ativismo, etc. Acreditamos que fomentar tais movimentos de articulação global com foco nas Savanas possa alcançar objetivos similares. Nesse sentido, pretendemos criar uma rede chamada Liga das Savanas, que buscará conectar diferentes organizações e lideranças na conservação destes biomas e, dessa forma, buscar estratégias comuns de proteção desses ecossistemas.
Salmona, Y. B., Matricardi, E. A. T., et al. (2023). A Worrying Future for River Flows in the Brazilian Cerrado Provoked by Land Use and Climate Changes. Sustainability, 15(5), 4251.
https://www.gov.br/icmbio/pt-br/assuntos/biodiversidade/unidade-de-conservacao/unidades-de-biomas/cerrado
https://www.dw.com/pt-br/ongs-criticam-lei-antidesmatamento-da-ue-por-excluir-cerrado/a-64006117
Favareto (org., 2019). Entre chapadas e baixões do MATOPIBA. Dinâmicas territoriais e impactos socioeconômicos na fronteira da expansão agropecuária no Cerrado. São Paulo: Prefixo Editoria.